25 abril, 2008

Chorei por mim e por ela e todos nós



Em uma época em que os filhos ainda eram pequenos e se prioriza cuidar deles eu a conheci.

Ela um pouco mais velha que eu mostrava-me que era possível ,tornar-se,mesmo que por poucos anos,dona de casa e mãe em tempo integral e que isso tinha seus encantos.

Ela ,minha amiga N,era muito mais pratica e desencanada,sem aquela mania que eu tinha de acertar sempre,me fez ver que casa com crianças não se mantém impecável e um lanchinho ,desses nada saudáveis não mata ninguém se forem oferecidos apenas nas horas de aperto.

Mesmo com horário apertados e finanças idem,arrumávamos meio de manter idéias e ideais. Corríamos contra o tempo entre escolinhas de esportes,aula de musica e todo o serviço da casa para que tivéssemos 2 tardes da semana ,apenas nossas.

Sempre sobrava tempo para um café ,eram tantas amostras,exposições e ensaios abertos de teatro que ela inventava,não sei onde conseguia todos esses lugares pra irmos.

Enquanto as outras mães,aquelas estranhas peruas ,passavam as horas em salões ou na porta do colégio fofocando e falando sobre criadas,compras e griffes ,sem entender como duas malucas sobreviviam com míseros jeans e camisetas e "babavam" em livros fedorentos(opinião de algumas) que comprávamos nos sebos que vivíamos visitando.

Eu estudava a noite e tinha nela uma ajudante dedicada que revezava com minha mãe e marido da época rs, cuidar das crionças.

Mesmo com os seus quatro ainda dava conta de inventar mil projetos nos dias que os meus ficavam com ela.

Em troca,ficava com os dela nos 2 sábados por mês que ela trabalhava como voluntária num asilo.

Muitas férias passamos juntas no sítio,eram verdadeiros comboios ,festas a fantasia,bailes animados,pescarias,passeios a cavalo ,longas conversas nas redes ,comilança e conversas em volta de um fogão a lenha,passeios de bicicleta e muitas histórias que ate hoje são relembradas por esses meninos que viraram homens e tiveram uma infância plena e feliz.

Foram 4 anos decorrerias entremeados de passeios e uma linda amizade,depois mais uns 2 anos de ida a verdadeiros inferninhos quando um dos meus filhos e dois dos dela resolveram montar uma banda de rock.

Conseguiam não sei onde contatos para tocarem até onde o Judas perdeu a meia,e lá íamos nós.

Sobrava tempo ainda para ,quando conseguíamos uma vitima pra ficar com a molecada ,jantarmos com nossos maridos e levarmos os pernas de pau pra dançar.

Enfim volto a trabalhar e as tardes que antes tínhamos para nós já estariam ocupadas de outra forma,mas como sempre fui minha patroa,arrumava saídas mais cedo e sempre sobrava tempo para um café na Cultura e um cineminha.

Se bem que muitas vezes tínhamos tanto a conversar que quando víamos o filme já tinha acabado.

Foi N que quando minha mãe adoeceu e parei o trabalho para me dedicar a ela ,me deu forças e foi muitas vezes mãe de meus filhos para que sobrasse tempo e eu pudesse focar na minha mãe e suas tantas cirurgias.

O filhos crescendo e havia semanas que só eles,os meninos, a viam,eu matava a saudades com conversas pelo telefone.

Cada um deles ,depois,escolheu cursos diferentes ,um dos gêmeos dela resolveu ser pai antes do previsto e ela novamente voltou a cuidar de criança.

Era imbatível nisso,mãe nata e pessoa brilhante.

Nos ver já era bem mais difícil ,raras vezes conseguíamos uma corridinha na Cultura e os tais livros,nossos amantes secretos.

Separei-me e ela sempre apaixonada pelo marido não entendia quando algo se perdeu,mas não deixou de me apoiar.

Minha mãe se foi e ela estava lá,para um abraço.

Nos últimos anos raramente nos víamos e ate os telefonemas rarearam,por falta de tempo,por falta de assunto.

Ela já não usava mais o jeans e a camiseta e cheguei a vê-la falando de criadas e discutindo uma griffe famosa.

Ela dizia que as coisas mudam ,evoluem e eu... continuo gostando da Cultura e dos tais livros "fedorentos".

Muito do que vivo hoje com certeza a deixaria horrorizada,ela era a "normalidade " esperada,mas nem por isso uma pessoa menos especial.

Um ataque do coração, a levou ontem,soube apenas hoje ,por um telefonema ,do filho dela,que dizia que nós sempre estávamos nas melhores recordações deles e que a mãe dele,sentia muita saudades da minha risada escrachada e meu jeitão moleca.

Ela havia sido cremada pela manhã e eu fiquei sem palavras. Apenas disse que não fosse ela talvez nunca tivesse tido o gosto de saber o que era ser mãe 24 hs por dia e GOSTAR muito disso.

Depois sozinha ...
chorei por mim ao constatar que vamos deixando as coisas pra lá é o telefonema que não deu pra dar o abraço que acabou ficando pra depois o eu te amo o pedido de desculpas.

Torço,para que esse repensar,esse alerta não passe na medida dos dias e da tristeza desse dia,que me sirva de alerta,para que eu viva mais , sobretudo,esqueça os "ses" que muitas vezes me impedem de sonhar meus sonhos.

Uma quinta feira 24 de maio

Eu chorando por mim...

por ela por seus filhos e marido.

Um dia que me fez chorar meus "mortos",

chorei por mim

pelas coisas que deixei morrer

como a muito eu não chorava...

Denise


Um comentário:

Anônimo disse...

Emocionante, sem palavras, ela aonde estiver está feliz e radiante com tanto amor e carinho, bjos no seu coração.